Apenas uma lembrança – pequena história envolvendo a FEB
Em 1978 estando como chefe da assessoria de Pesquisa e Desenvolvimento do Departamento Geral dos Serviços, escrevi (devidamente autorizado) para os principais capitães de indústria desafiando-os a propor e fabricar algum equipamento que gostariam que os soldados da nossa Pátria usassem em combate.
O resultado foi surpreendente. Grandes industriais vinham conversar às dezenas e quase sempre perguntavam o que o Exército desejava, ao que respondíamos, que seria desde um aperfeiçoamento dos equipamentos existentes até algo totalmente novo, que seja mais útil, eficiente e barato.
Foquemo-nos em um senhor robusto aparentando uns 65 anos, que se apresentou com o nome de Wlastimir Arambasic, que nos perguntou como gostaríamos que fossem os coturnos, ao que respondemos: resistente, confortável, leve, barato e se possível bonito. Gostaríamos ainda que tivesse travas na sola, como nas chuteiras, afim de não escorregar na lama.
Passado um mês o referido cavalheiro adentra-se na minha sala e joga na minha mesa um par de coturnos com os aperfeiçoamentos pedidos e exclama: Está aí, coronel, a resposta ao seu desafio.
Ainda enquanto eu examinava os coturnos ele iniciou a nos contar que era iugoslavo e que havia servido nas tropas de Tito, do qual se afastara por aversão ao comunismo; que fora para a Itália e teve a fortuna de fazer reconhecimentos para a FEB e mesmo participar de combates e que veio para o Brasil no navio, disfarçado de pracinha, escondido por um capitão chamado Restel.
Disse-nos ainda que ao receber o nosso desafio ficou pensando em que calçado gostaria de ter usado em seu tempo de guerrilheiro, quando precisava andar mais ligeiro que os inimigos porque se o pegassem lhe arrombariam o traseiro com a sua própria arma e que teria prazer em colaborar com o Exército Brasileiro, e que poderia fazê-lo pois desde que aqui chegou iniciou a fabricar calçados, coisa que a família fazia a duzentos anos e que agora ele tinha a maior fábrica do Hemisfério Sul.
Neste meio tempo eu já havia identificado o Capitão Restel da FEB, como o então General Rubens Restel, Chefe do Gabinete do Ministro. Discretamente por telefone, informei ao General a presença de seu camarada de armas de outrora e a emoção dos dois pode ser imaginada. Afastei-me para deixar que ambos desfrutassem do reencontro recordando os feitos na guerra e sabendo dos mais de 30 anos sem notícias um do outro.
Naturalmente houve desdobramentos, mas terminemos aqui no momento feliz pois desses acontecimentos, já passaram uns 40 anos e as pessoas citadas certamente já não estão entre nós. Permanecem ainda as lembranças de quem assistiu. Essas um dia acabarão, mas as consequências das ações perpetradas pelos protagonistas desta história talvez tenham influência ainda durante muito tempo.
Gelio Fregapani